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Universidades públicas repudiam PEC que propõe cobrança de mensalidades

Universidades públicas de todo o país têm se mobilizado contra a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 206/19, que propõe a cobrança de mensalidade para alunos das instituições públicas de ensino superior. O assunto seria votado quarta-feira (25), na Câmara dos Deputados, mas acabou tirado de pauta devido à ausência do relator.

De acordo com o último Censo do Ensino Superior de 2020, o Brasil tinha 1,956 milhão de estudantes matriculados em instituições públicas de ensino superior. A edição de 2021 ainda será divulgada pelo órgão pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), que faz parte do Ministério da Educação.

Nesta quinta-feira (26), a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e outras oito importantes instituições de ensino de estado emitiram nota de repúdio pela movimentação de grupos políticos da Câmara dos Deputados, que tentam articular o avanço da PEC.

De acordo com a nota, “as universidades públicas não foram consultadas sobre a matéria que lhes diz respeito –o que parece básico a qualquer atividade legislativa, já que o legislar prescinde, fundamentalmente, de diálogo”.

Os reitores destacam ainda que as universidades contribuem para o crescimento econômico, social e científico do país, uma vez que formam profissionais qualificados. Argumentam também que passar a cobrar o pagamento das mensalidades seria um equívoco sem precedentes.

“A mensalidade não seria suficiente para garantir e manter o modelo de universidade que defendemos, com carreira dos servidores em dedicação exclusiva e laboratórios de pesquisa em pleno funcionamento; e o pagamento por parte dos estudantes geraria falta de isonomia nos bancos das universidades, o que seria péssimo para a democracia interna e fonte de injustiças.”

O texto original da norma propõe que a gratuidade seja mantida apenas para os estudantes que comprovem a incapacidade de pagar mensalidade, em critérios estipulados pelas próprias instituições de ensino, a partir de parâmetros definidos pelo Executivo.

Assim, não é possível estimar quantos estudantes seriam afetados de imediato, em caso de aprovação e sanção da proposta.

Marcus Vinícius David, presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), considera a PEC precipitada. “Faculdades públicas têm um caráter social. E essa ideia precisa ser estudada com cautela e analisada com base em estudos. Como estabelecer parâmetros para dizer qual aluno será cobrado? Não acredito que cobrar os alunos seja a melhor solução. Não se pode determinar isso a partir de uma PEC com apenas um artigo. Isso exige uma análise muito mais aprofundada”, afirma David, também reitor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).

Uma pesquisa da Andifes, de 2018, aponta que a maior parte dos estudantes do ensino superior federal é de baixa renda. Na ocasião, 70,2% dos estudantes apresentavam renda per capta mensal familiar de até um salário-mínimo e meio.

O economista Paulo Meyer Nascimento, estudioso de modalidades de financiamento do ensino superior, professor da Escola de Políticas Públicas e Governo Fundação Getulio Vargas (FGV EPPG) e pesquisador do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea), entende que a universidade pública precisa de novas modalidades de financiamento. No entanto, na visão dele, passar a cobrar a mensalidade dos alunos não seria a melhor maneira para custear as despesas das instituições.

Para ele, o melhor caminho é garantir que o estudante não pague nada durante o curso e arque com as despesas depois de formado, com alíquotas progressivas atreladas à renda do indivíduo. Dessa maneira, seria possível garantir também a proteção dos mais vulneráveis: desempregados ou pessoas em condições de renda muito baixa não pagariam enquanto estivessem nessa condição.

“A mensalidade é ruim porque cria uma barreira financeira para quem quer estudar. E o financiamento tradicional traria o problema de o estudante carregar uma dívida que não sabe se terá condições de bancar. O modelo que proponho é vinculado à renda e cobrado pela Receita Federal, retido na fonte, semelhante ao Imposto de Renda. Há experiências semelhantes a essas em países como Austrália, Hungria, Nova Zelândia e Uruguai”, avalia Meyer Nascimento.

Fonte: G1